A Fundação do Câncer publicou um boletim periódico inédito e atual sobre o panorama do câncer no Brasil. Através de dados, análises e discussões mostraremos um retrato epidemiológico da doença no país. O info.oncollect traz diferentes guias de prevenção, análises e tendências de diferentes tipos de câncer, em especial o de colo de útero.
Em relação à metodologia da pesquisa, foram utilizadas as informações sobre incidência do câncer do colo do útero (neoplasia maligna – C53 e neoplasia in situ – D06) de 26 Registros de Câncer de Base Populacional (RCBP) brasileiros, com informações disponíveis para até os últimos cinco anos de referência, englobando o período de 2005 a 2019.
Somente para este ano são estimados, pelo Ministério da Saúde, mais de 16 mil novos casos de câncer de colo de útero, apesar da divulgação de medidas de prevenção e de controle e da existência da vacina contra o papilomavírus humano (HPV), causador desta doença.
“É essencial a vacinação contra o HPV em crianças e jovens com idades entre 9 e 14 anos, que tem sido um tema recorrente nas campanhas da Fundação. E essa publicação visa reunir esforços para alertar a sociedade e orientar profissionais de saúde sobre o tema”, disse o diretor-executivo da Fundação do Câncer, Luiz Augusto Maltoni, na publicação.
Ligação direta entre câncer do colo do útero e HPV
O boletim aborda a ligação direta entre câncer do colo do útero e o HPV. “Vale ressaltar que não há correlação do câncer do colo do útero com o envelhecimento populacional, mas sim com a ausência de detecção precoce, diagnóstico e tratamento oportuno”, ressaltou o médico e pesquisador associado ao Centro de Estudos Estratégicos da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), Luiz Antonio Santini, ex-diretor do Instituto Nacional do Câncer (Inca), de 2005 a 2015.
De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), é importante destacar que, em 2019, o câncer foi a primeira causa de óbito em pessoas abaixo de 70 anos em 112 países. Uma em cada seis óbitos no mundo está associada ao câncer.
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“No Brasil, o câncer já é a primeira causa de óbito em mais de 600 municípios. Portanto, não há dúvida: o câncer é um dos maiores problemas de saúde pública no mundo e no Brasil. Abordar o tema em boletins como este é importante e necessário para o enfrentamento da doença. O problema é que para o controle do câncer são necessárias intervenções em diferentes níveis: desde prevenção primária, para reduzir ou evitar a exposição a fatores de risco individuais ou ambientais, medidas de prevenção como a vacina do HPV, passando pelas possibilidades de detecção precoce, até tratamentos complexos e sofisticados, além de apoio ao desenvolvimento de pesquisas”, afirmou Luiz Antonio Santini.
Neoplasia maligna versus neoplasia in situ
Em um dos gráficos apresentados no boletim nota-se que, em todas as regiões brasileiras, as mulheres com neoplasia maligna do colo do útero chegam à unidade de saúde com estadiamento avançado (50,5%). Na região Sudeste encontra-se o maior percentual de mulheres que chegam para tratamento ainda no estádio I (23,1%). Se considerados os estádios I e II, as regiões Norte (53,0%) e Sudeste (51,6%) alcançaram os maiores percentuais.
Já em outro gráfico, é possível notar o grande o percentual de mulheres com câncer do colo do útero encaminhadas para a unidade de saúde via Sistema Único de Saúde (SUS), tanto em caso de neoplasia in situ – que ocorre quando o tumor não ultrapassou a membrana basal, estando presente apenas no local inicial – (88,7%) quanto maligna (83,9%), percentuais do Brasil.
Observa-se que tanto para a neoplasia in situ quanto para a neoplasia maligna, o maior encaminhamento registrado via SUS encontra-se na região Sul: 93,0% e 92,7%, respectivamente.
Os maiores percentuais de encaminhamento de mulheres com câncer do colo do útero através do sistema privado de saúde foram registrados na região Norte: 10,9% para neoplasia in situ e 19,4% para neoplasia maligna. No Nordeste registra-se o maior percentual de mulheres que chegam às unidades de saúde por conta própria, tanto para neoplasia in situ (6,4%) quanto para a maligna (6,9%).
Tratamentos mais realizados
Outro gráfico aponta que a cirurgia foi o primeiro tratamento realizado na maioria das mulheres com neoplasia in situ do colo do útero no país (92,3%). Já a radioterapia foi o primeiro tratamento recebido pelas mulheres com neoplasia maligna do colo do útero no Brasil (51,0%), refletindo, assim, a maior percentagem de diagnósticos em estágio avançado.
Na região Centro-Oeste, os dois tipos de tratamento mais utilizados em caso de neoplasia maligna foram a radioterapia (36,0%) e a cirurgia (33,2%). Já na região Norte, os dois tipos de tratamentos mais utilizados para o mesmo caso foram a radioterapia (53,2%) e a quimioterapia (21,7%). A cirurgia aparece como terceira opção com 18,1%. Nas demais regiões brasileiras, a quimioterapia aparece como o terceiro tratamento mais recorrente.
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Taxas de incidência de mortalidade
Para as análises das taxas de incidência e de mortalidade foram incluídas no boletim as mulheres dentro da faixa etária do programa de rastreamento para o câncer do colo do útero (25 a 64 anos) do Ministério da Saúde.
Segundo as informações apresentadas no info.oncollect, observa-se uma grande variabilidade das taxas de incidência tanto para neoplasia in situ quanto para neoplasia maligna dentre as regiões do país. Esse cenário aponta para necessidades relacionadas a políticas de prevenção primária e detecção precoce em níveis diversos, demandando ações diferenciadas conforme o diagnóstico situacional de cada região.
Os dados mostram que mais de 50% dos casos de neoplasia do colo do útero são diagnosticados em fase avançada (estádios III e IV), revelando falhas em detectar precocemente esse câncer. Este fato implica em pior prognóstico, maior mortalidade e menor sobrevida das mulheres.
“Observa-se que mais de um terço das mulheres que chegaram à unidade hospitalar sem diagnóstico e sem tratamento, independentemente se neoplasia in situ ou maligna, receberam tratamento após 60 dias. E mais de 65% das mulheres que chegaram à unidade hospitalar com diagnóstico e sem tratamento não o receberam dentro do prazo de 60 dias. Os achados apontam que muito ainda precisa ser feito para resolver este problema e cumprir a lei 12.732/12, que determina que pacientes com câncer devem iniciar o tratamento em até 60 dias após o diagnóstico da enfermidade”, concluiu o documento da Fundação do Câncer.
Este texto foi revisado pela equipe médica do Portal PEBMED.