Ablação é melhor que antiarrítmicos em pacientes com FA paroxística?

Estudo comparou a ablação por cateter com terapia medicamentosa e mostrou redução da recorrência de arritmias atriais.

A fibrilação atrial (FA) é doença crônica e progressiva que tem períodos de exacerbação e de remissão. Geralmente se inicia como uma alteração elétrica no sistema de condução cardíaco, porém gera remodelamento elétrico e estrutural progressivos, o que leva a formas mais persistentes da doença.

A progressão de FA paroxística (duração menor que 7 dias) para FA persistente (duração maior ou igual a 7 dias) ocorre em até 15% dos pacientes no período de um ano e tem relação com aumento de eventos tromboembólicos, insuficiência cardíaca e procura por atendimento médico. Estudos randomizados não mostraram diferença entre controle de ritmo ou controle de frequência cardíaca em pacientes com FA já estabelecida, porém alguns estudos recentes mostraram que em pacientes com FA há menos de um ano parece haver benefício do controle de ritmo.

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Uma forma de reduzir a recorrência da arritmia é com a ablação por cateter, que pode ajudar a limitar a progressão da doença e melhorar os desfechos clínicos. O tratamento medicamentoso tem papel importante na manutenção de ritmo sinusal, porém parece não reverter o remodelamento atrial e a progressão da doença como a ablação.

O estudo EARLY-AF comparou a ablação por cateter (crioablação) com terapia medicamentosa para controle de ritmo em pacientes com FA paroxística sintomática e mostrou redução da recorrência de arritmias atriais (FA, flutter atrial ou taquicardia atrial). Foi feita então uma análise do seguimento tardio desses pacientes para avaliar o efeito do controle inicial de ritmo na progressão para FA persistente por meio de um monitor de eventos implantável.

Ablação é melhor que antiarrítmicos em pacientes com FA paroxística

Métodos do estudo

Foi estudo multicêntrico, aberto e randomizado com desfecho cego realizado no Canadá. O objetivo era avaliar o efeito do controle de ritmo na recorrência de taquiarritmias atriais em 1 ano, além de fazer uma avaliação da progressão de doença em 3 anos de seguimento, com uso de um monitor cardíaco implantável para monitorização contínua de ritmo.

Para inclusão os pacientes deveriam ter mais de 18 anos, FA paroxística sintomática e pelo menos um eletrocardiograma documentando a fibrilação atrial até 2 anos antes da randomização. Pacientes que usavam antiarrítmicos de classe I ou III em doses terapêuticas foram excluídos.

Todos os pacientes receberam um monitor de eventos implantável que analisava todos os batimentos de forma contínua para determinar a ocorrência de arritmia e sua proporção (porcentagem do tempo em que permanecia em arritmia). Anticoagulação oral era prescrita para todos os pacientes com mais de 65 anos ou com CHADS2 de 1 ou mais.

O desfecho primário era a ocorrência de um primeiro episódio de taquiarritmia atrial com duração maior que 30 segundos entre 91 e 365 dias após a realização do procedimento ou início do tratamento medicamentoso. Foi também avaliada a primeira ocorrência de episódio de taquiarritmia atrial contínua com duração de pelo menos 7 dias ou duração entre 48 horas e 7 dias com necessidade de cardioversão para sua resolução.

O seguimento de 3 anos avaliou qualidade de vida, por meio de questionários específicos, e sintomas de FA. Desfechos secundários foram a proporção de arritmia, qualidade de vida, utilização de serviços de saúde, internações, cardioversão, ablação fora do protocolo e eventos adversos graves.

Resultados

Entre 2017 e 2018 foram incluídos 303 pacientes, sendo 154 no grupo crioablação e 149 no grupo tratamento medicamentoso com antiarrítmicos. As características dos dois grupos eram semelhantes e, em 3 anos de seguimento, 63 pacientes inicialmente randomizados para o grupo tratamento medicamentoso foram submetidos a ablação por cateter por recorrência de arritmia. Dos pacientes que realizaram ablação, 27 precisaram de novo procedimento no período. O CHA2DS2-VASc médio foi de 1 e o uso de anticoagulantes foi indicado para 65,7% dos pacientes no início do estudo e 67,7% ao final de 3 anos.

FA persistente ocorreu em 3 pacientes (1,9%) do grupo submetido a ablação e em 11 (7,4%) do grupo tratamento medicamentoso. A duração média da FA persistente detectada foi de 15,8 dias e, ao longo de 3 anos, houve taquiarritmia com duração maior que 30 segundos em 87 pacientes (56,5%) do grupo ablação e em 115 (77,2%) do grupo tratamento medicamentoso. Desses episódios, 89,1% eram FA.

Sintomas de FA foram mais frequentes no grupo de tratamento medicamentoso em 1, 2 e 3 anos (26,8% x 14,9%; 16% x 5,5%; 17,1% x 4,8% respectivamente), com diferença estatística. Internação ocorreu em 16,8% no grupo de tratamento medicamentoso e 5,2% no grupo ablação, também com diferença, assim como também foi encontrada diferença nos escores de avaliação de qualidade de vida.

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Comentários e conclusão sobre ablação na ablação na FA paroxística

Este estudo mostrou que a crioablação por cateter teve associação com menor incidência de FA persistente, avaliada por monitorização contínua pelo monitor cardíaco implantável, sendo o NNT de 18. A proporção de tempo em que o paciente teve taquiarritmia também foi menor no grupo submetido a ablação. Além disso, houve melhor qualidade de vida e menor incidência de internação nos 3 anos de seguimento no grupo submetido a ablação.

Diferente da terapia medicamentosa, a ablação parece influenciar na progressão da doença e no remodelamento elétrico e estrutural, com menor progressão da FA paroxística para FA persistente.

Alguns pontos importantes a serem ressaltados são que a população do estudo era diferente de estudo prévios, com pacientes mais jovens e mais saudáveis, com menor número de comorbidades, o que pode ter tido impacto nos resultados, já que foram incluídos num contexto de FA de início mais recente, sem tanta influência ainda do já conhecido remodelamento.

Ainda, a técnica de ablação utilizada foi apenas uma, não sendo possível extrapolar esses resultados para outras técnicas e dispositivos disponíveis. Importante enfatizar que a ablação não deve ser indicada no intuito de não se utilizar anticoagulantes, pois nenhum estudo avaliou a suspensão deste tratamento após ablação e o risco de ocorrência de eventos tromboembólicos pode ainda ser considerável.

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Referências bibliográficas: Ícone de seta para baixo
  • Andrade JG, et al. Progression of Atrial Fibrillation after Cryoablation or Drug Therapy. N Engl J Med. 2022 Nov 7. DOI: 10.1056/NEJMoa2212540

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