DPOC em pacientes cardiopatas: Como tratar um sem atrapalhar o outro?

A coexistência de doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC) em pacientes cardiopatas é frequente e ocorre em múltiplas situações.

Este conteúdo foi produzido pela PEBMED em parceria com Chiesi de acordo com a Política Editorial e de Publicidade do Portal PEBMED.

Tratar o coração de pacientes com doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC) é uma situação frequente para cardiologistas. Tratar o pulmão de pacientes cardiopatas é uma situação frequente para pneumologistas. Ambas as situações são comuns para clínicos e geriatras. Uma dúvida que pode surgir nestes casos é: “Como tratar uma doença do meu paciente sem interferir na outra?”. Ou mesmo, ainda melhor, como tratar ambas as doenças do meu paciente para um desfecho excelente?

Pacientes com DPOC comumente têm insuficiência cardíaca (IC), doença arterial coronariana (DAC) ou arritmias.

  • A presença de IC se deve em grande parte à disfunção diastólica (cursando com IC de fração de ejeção preservada), de diagnóstico por vezes difícil, sendo ela um marcador independente de mortalidade.1, 2
  • Além de compartilharem fatores de risco em comum, DAC e DPOC se correlacionam pelo fato de que pacientes com DPOC frequentemente são portadores de DAC e têm maior risco de eventos cardiovasculares (como infarto e AVC) nas semanas a meses após um episódio de exacerbação da doença.1
  • As arritmias, por sua vez, são predominantemente representadas pela fibrilação atrial (FA). A FA é comum e pode ser uma causa de piora ou mesmo uma causa alternativa aos sintomas dos pacientes com DPOC.1

As bases do tratamento farmacológico da DPOC são broncodilatadores (agonistas beta-2 e antimuscarínicos) e corticoides inalatórios (CI). Tendo em vista as interações descritas acima, é muito comum haver angústias na hora de prescrever algumas destas medicações, por medo de precipitar arritmias ou eventos cardiovasculares. Estas preocupações têm como base alguns estudos que sugeriram eventos adversos cardiovasculares com estas medicações.1,3-5 No entanto, algumas considerações importantes devem ser feitas:

  • Em primeiro lugar, é importante lembrarmos que a DPOC é uma doença grave e potencialmente limitante, o que torna seu tratamento imperativo, e pacientes com FA, IC e DAC devem receber o tratamento para a doença pulmonar.1
  • Os LABA (long acting beta-2 agonists, os beta-2 agonistas de longa duração como o formoterol e o salmeterol) e os LAMA (long acting muscarinic antagonists, os antimuscarínicos de longa duração como o tiotrópio e o glicopirrônio) tiveram sua segurança questionada em alguns estudos, por possivelmente aumentar eventos cardiovasculares ou hospitalizações por IC.3-5
  • Uma revisão sistemática de 20236 incluiu 51 ensaios clínicos randomizados com as combinações LABA/LAMA ou LABA/LAMA/CI, tendo um total de 91.021 pacientes. O estudo apresentou uma baixa incidência de eventos cardiovasculares associados ao uso de broncodilatadores, com diferenças pequenas entre as associações vs CI/LABA (1,6% vs 1,3% – LABA/LAMA; e 1,6% vs 1,4% – LABA/LAMA/CI). Esta diferença foi mais percebida nos estudos que incluíram pacientes com risco maior de eventos cardiovasculares.
  • Essas medicações têm efeitos positivos bem definidos na literatura, como melhora de sintomas e redução de exacerbações, o que parece levar a balança de risco/benefício a seu favor.1 A ponderação a ser realizada sempre é: “Para este meu paciente específico, me parece haver maior benefício ou risco de iniciar ou otimizar este tratamento”? E a resposta vai passar por um diagnóstico de DPOC bem feito, avaliação da gravidade e estabilidade da doença cardiovascular e entender se a dispneia atual do paciente é de fato pela doença pulmonar para ajuste correto da dose das medicações.

Olhando a situação pelo outro ponto de vista, o tratamento de pacientes cardiopatas frequentemente passa pelo uso de betabloqueadores, o que também pode gerar preocupações em pacientes com DPOC, uma vez que usamos justamente beta-agonistas para o tratamento da doença pulmonar. De forma semelhante, o tratamento da doença cardíaca deve ser feito da maneira habitual, uma vez que seus benefícios também são bem estabelecidos na literatura.

  • Pacientes com IC de fração de ejeção reduzida devem receber betabloqueadores, preferencialmente seletivos, como o succinato de metoprolol e o bisoprolol. Caso apenas o carvedilol (betabloqueador não seletivo com ação alfabloqueadora) esteja disponível, este deve ser usado.11
  • Pacientes com FA e necessidade de controle de frequência cardíaca devem preferencialmente receber bloqueadores dos canais de cálcio não diidropiridínicos (diltiazem e verapamil).12
  • Assim como no tratamento de DPOC em pacientes com doença cardíaca, sempre avaliar o paciente individualmente, fazendo o diagnóstico correto e determinando a indicação correta das medicações.

Em resumo, a disputa pela soberania “beta” é mais teórica do que prática. Pacientes com DPOC e doença cardiovascular devem receber o tratamento para DPOC, e vice-versa. Os cuidados a serem tomados são o diagnóstico correto e a indicação correta das medicações em questão.

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Referências bibliográficas: Ícone de seta para baixo
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