O impacto da testagem farmacogenética no tratamento de depressão

A necessidade de se encontrar biomarcadores que auxiliem na escolha dos antidepressivos demonstram a importância da testagem farmacogenética.

A escolha de medicamentos para tratamento de transtorno depressivo é eminentemente imprecisa, o que se reflete em taxas de remissão baixas com o tratamento inicial (menos de 40%). Para os pacientes que não melhoram após duas ou mais tentativas de tratamento com antidepressivos, as taxas de remissão são menores que 20%. Essas falhas de tratamento prolongam o tempo de adoecimento, estão associadas a maiores perdas sociais e aumentam o risco de suicídio dos pacientes.

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Esses dados evidenciam a necessidade de se encontrar biomarcadores validados que possam predizer a resposta ao tratamento e auxiliar na escolha dos antidepressivos. Nessa direção é que os estudos avaliando se o uso os testes farmacogenéticos levam a melhores desfechos clínicos mostram sua importância. A maior parte das testagens farmacogenéticas focam em variações dos genes que codificam as enzimas do citocromo P450, ou seja, em variações gênicas que implicam em alterações farmacocinéticas do metabolismo.

O impacto da testagem farmacogenética no tratamento de depressão

Novo estudo sobre farmacogenética

O Precision Medicine in Mental Health Care Trial (PRIME Care) é um estudo pragmático simples-cego multicêntrico conduzido em 22 centros médicos do Departamento de Assuntos de Veteranos (VA).

Métodos

Os pacientes elegíveis estavam recebendo atendimento nos centros médicos de VA, com idades entre 18 e 80 anos, com diagnóstico de Transtorno Depressivo Maior (Pontuação no PHQ-9 > 9), história prévia de pelo menos um episódio depressivo e plano para iniciar um novo tratamento em monoterapia antidepressiva (mudança de um tratamento anterior ou iniciar um novo antidepressivo). O ensaio clínico foi realizado por Oslin et al entre 2017 e 2021 envolvendo 1944 pacientes que não tivessem diagnóstico de transtorno por uso de substâncias, transtorno bipolar, psicose, transtorno de personalidade boderline ou antissocial, tratamento com medicações antipsicóticas, metadona, buprenorfina, naltrexona ou em uso de tratamento de potencialização antidepressiva.

Os desfechos primários eram a proporção de prescrições com uma interação droga-gene 30 dias após a randomização e remissão de sintomas depressivos avaliados pela Patient Health Questionnaire–9 (PHQ-9) (remissão foi definida como PHQ-9 < 5) e foram analisados nas semanas 4, 8, 12, 18 e 24 por avaliadores cegos.

Resultados

Resultados dos testes farmacogenéticos eram dados ao grupo guiado por testes (n=966) – recomendava-se que os clínicos aguardassem o resultado do teste e discutissem o mesmo com os pacientes antes de iniciar o tratamento e o grupo de controle recebeu cuidados usuais e puderam acessar os testes farmacogenéticos após 24 semanas (n=978).

O grupo guiado pelo teste farmacogenético teve mais chance de receber um antidepressivo sem interação droga-gene. O risco estimado de nenhuma, moderada e grande interação para o grupo guiado pelo teste foi 59,3%, 30,0% e 10,7% em comparação com 25,7%, 54,6% e 19,7% para o grupo de cuidados habituais.

Houve maiores taxas de remissão no tratamento guiado por testagem farmacogenética grupo ao longo das 24 semanas (efeito de grupo), com diferenças significativas entre os grupos nas semanas 8 e 12 e sem diferenças significativas entre os grupos nas semanas 4, 18 e 24. Com 24 semanas, 130 pacientes no grupo guiado por farmacogenética e 126 no o grupo de cuidados habituais atendeu aos critérios de remissão, ou seja, sem diferença estatística.

Desfechos secundários de resposta ao tratamento e redução da gravidade dos sintomas também favoreceu o grupo de testagem farmacogenética. Não houve diferença estatisticamente significante em taxas de resposta.

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Considerações

Entre os pacientes com Transtorno Depressivo Maior, o fornecimento de testagem farmacogenética para interações medicamento-gene reduziu a prescrição de medicamentos com interações medicamentosas-gene previstas em comparação com os cuidados habituais. No geral, houve pequenos efeitos positivos na remissão dos sintomas ao longo das 24 semanas com diferenças de pico no início do estudo e nenhuma diferença significativa na remissão na 24ª semana. Os resultados secundários da resposta e a redução dos sintomas seguiram padrões semelhantes.

Algumas questões que limitaram o estudo foram o grande número de pacientes que não iniciaram antidepressivo 30 dias após a randomização, em ambos os grupos (25% dos pacientes do grupo intervenção e 31% dos pacientes do grupo controle), a falta de cegamento de clínicos e pacientes, as taxas de resposta e remissão baixas em ambos os grupos, comparáveis com a frequência de melhora de grupos refratários ao tratamento no STAR*D, a ausência de melhora clínica entre as semanas 12 e 24 — sem que seja explicado no estudo a razão, além dele não ter sido desenhado para avaliar efeitos de mudanças de dose, presença de reações adversas, efeito na adesão dos pacientes e efeito das trocas de antidepressivos após a randomização.

Conclusão

Assim, a diferença de resposta clínica em favor do grupo guiado pela testagem farmacogenética foi modesta, não persistente ao longo do tempo e provavelmente sem muita significância clínica.

Mensagem prática sobre testagem farmacogenética

Em última análise, a decisão clínica de usar ou não testes farmacogenéticos deve ser guiada por uma consideração de risco-benefício, levando em consideração o elevado custo atual dos testes.

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Referências bibliográficas: Ícone de seta para baixo
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