Prevalência do aleitamento materno exclusivo e fatores associados em Cabo Verde

Estudo avaliou a prevalência do aleitamento materno exclusivo e fatores associados a essa prática no país africano.

Em Cabo Verde, na África, a prevalência do aleitamento materno exclusivo (AME) pode ser considerada razoável, conforme um estudo conduzido por Duarte Lopes e colaboradores e publicado recentemente no periódico BMC Nutrition. O artigo mostra, inclusive, que o AME no país é influenciado pela idade materna, escolaridade, paridade e número de consultas de pré-natal.

O AME nos primeiros seis meses de vida do bebê é essencial para a saúde materno-infantil e o leite materno é o alimento mais indicado para a criança nos primeiros anos de vida. Estudos previamente realizados em Cabo Verde mostraram uma prevalência de AME abaixo dos valores recomendados pela Organização Mundial de Saúde (OMS) e pelo Fundo de Emergência Internacional das Nações Unidas para a Infância (UNICEF). No entanto, os determinantes do AME em toda a nação africana nunca foram identificados. Dessa forma, o objetivo do estudo de Duarte Lopes e equipe foi estimar a prevalência e identificar os determinantes do AME o país.

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Prevalência do aleitamento materno exclusivo e fatores associados em Cabo Verde

Metodologia

Os pesquisadores realizaram um estudo quantitativo, descritivo e transversal no período entre julho de 2018 e março de 2019. A população do estudo foi constituída por 1.717 mães de crianças com idade igual ou inferior a dois anos, que utilizavam, para acompanhamento do desenvolvimento de crianças e imunização, os Centros de Saúde das ilhas de Santo Antão, São Vicente, Sal, Santiago e Fogo, locais com maior taxa de natalidade no país.

As mães foram entrevistadas por meio de um questionário estruturado, adaptado pelos pesquisadores de um modelo utilizado em um estudo brasileiro, composto por 39 itens. Foram coletados dados demográficos, socioeconômicos, informações sobre pré e pós-natal, estado de saúde da mãe, nascimento do filho e sobre os determinantes do aleitamento materno.

Os critérios de inclusão foram: ser mãe menos de 24 meses antes da entrevista, estar presente no Centro de Saúde nos dias reservados para a coleta de dados e concordar voluntariamente em participar do projeto. O critério de exclusão foi ser portadora de uma condição clínica e retardo ou distúrbio mental que impedisse a resposta ao questionário. Foram excluídos todos os questionários incompletos.

A prevalência do AME foi estimada por análise de frequência. O teste do qui-quadrado (X2) foi utilizado para avaliar a associação entre a duração do AME e as variáveis licença maternidade, escolaridade da mãe, renda familiar e variáveis assistenciais. Para identificar os determinantes do AME, utilizou-se a análise de regressão logística binária.

Resultados

A amostra total resultou em 1.717 mães atendidas em Centros de Saúde de 11 municípios de Cabo Verde. A idade das mulheres variou entre 13 e 48 anos (média de 26). A maioria era solteira (58,9%), possuía ensino médio (57%), declarava renda familiar mensal inferior a 30.000$00 (30.000 escudos cabo-verdianos, equivalentes a 1,43 reais) (71,1%), residia na zona urbana (70,5%) e relatou ter mais de um filho (58,3%).

No momento da coleta de dados, 32,5% das mães praticavam o AME. O resultado da análise de regressão logística binária indicou que, em geral, idade inferior a 26 anos (odds ratio [OR]=2,10), ensino médio ou superior (OR=1,55), mais de oito consultas de pré-natal (OR=1,61) e ter mais de duas crianças (OR=1,88) estão significativamente associadas ao aleitamento materno (p < 0,05).

Os motivos para aderência ao AME foram:

  • O leite materno é o melhor alimento para o bebê – N = 319 (18,7%);
  • O leite materno é uma alimentação saudável – N= 153 (8,9%);
  • O leite materno ajuda no desenvolvimento da criança – N = 90 (5,2%);
  • Fui avisado – N = 73 (4,3%);
  • O leite materno previne infecções na criança – N = 55 (3,2%);
  • Eu tinha leite suficiente – N = 51 (3,0%);
  • É um direito da criança – N= 45 (2,6%);
  • É um ato de amor/vínculo – N = 27 (1,6%);
  • É mais prático – N = 12 (0,7%);
  • O aleitamento materno protege a saúde da mãe – N = 10 (0,6%);
  • É dever/prazer da mãe – N = 10 (0,6%);
  • O leite materno é mais barato – N= 8 (0,5%);
  • O leite materno protege o bebê de alergias – N = 1 (0,1%);
  • A criança precisa de amamentação – N = 1 (0,1%);
  • Mais que uma opção acima – N = 817 (47,9%);
  • Todas as respostas anteriores – N = 13 (0,8%);
  • Não sabia – N = 14 (0,8%);
  • Não especificado – N = 6 (0,5%);
  • Já os motivos da não adesão ao AME foram:
  • A mãe tinha que trabalhar/estudar – N = 68 (20,9%);
  • A mãe sentiu que o leite era insuficiente – N = 52 (16%);
  • A mãe não gostava/quer amamentar – N = 50 (15,4%);
  • A criança não aceitou – N = 27 (8, 3%);
  • Aconselhamento médico – N = 20 (6,1%);
  • Problemas mamários – N = 9 (2,8%);
  • A mãe achava o leite fraco – N = 8 (2,5%);
  • Estética – N = 7 (2,2%);
  • Gravidez – N = 5 (1,5%);
  • Viagem da criança/mãe – N = 5 (1,5%);
  • Uso de mamadeira e chupeta – N = 2 (0,6%);
  • Doença da criança – N =4 (1,2%);
  • Mais de uma opção – N = 37 (11,4%);
  • Começou a alimentar a criança com água/comida – N = 31 (9,6%).

O estudo mostrou que o AME é influenciado por diversos fatores. Os mais representativos são idade materna (odds ratio [OR]=0,001), escolaridade (OR=0,028), paridade (OR=0,004) e número de consultas de pré-natal (OR=0,019). Por fim, receber orientação sobre aleitamento materno foi a única variável assistencial que se associou à duração do AME (p=0,029). Além disso, os pesquisadores descreveram que houve associação positiva entre AME e a variável “aconselhamento sobre amamentação” (X2 (1717;2) = 4,926; p=0,029 < p=0,05). No entanto, não houve associação entre licença maternidade e AME (X2 (1059;1) = 0,032; p=0,865).

Conclusão

O estudo conclui que, em Cabo Verde, a prevalência do AME pode ser considerada razoável. Mães com idade igual ou inferior a 26 anos, ensino médio e superior, mais de dois filhos e oito ou mais consultas de pré-natal foram mais aderentes a essa prática. A percepção de que o leite materno é o “melhor alimento para o bebê” é o principal motivo de adesão ao AME. No entanto, a necessidade de trabalhar ou estudar tem sido apontada como o principal motivo para a não adesão. Segundo os pesquisadores, entre as variáveis de atenção à saúde, o aconselhamento em amamentação parece ser a única influência positiva para o AME. Todavia, os autores destacam que os achados do estudo devem ser interpretados à luz das limitações apresentadas: utilização de uma amostra estratificada por ilha e concelho em todo o país, representando mães com filhos de 6 meses, em vez das que procuram cuidados de saúde; verificação dos motivos de as mães não completarem o número de consultas de pré-natal estipulado pela OMS, e análise da lacuna entre os ambientes/áreas de atenção pré-natal. Essas limitações servem de base para análises futuras.

Comentário

Em pleno “Agosto Dourado”, mês dedicado exclusivamente ao aleitamento materno, esse artigo nos traz muita informação sobre diversos mitos acerca da prática de amamentação exclusiva e ratifica a relevância da orientação das famílias sobre o quão precioso, saudável e econômico é o ato de amamentar.

Uma das metas estabelecidas pela OMS é a de se alcançar uma taxa de 50% de AME em todo o planeta até 2025. Em 2017, esse percentual foi de 41%. Como mostrado no artigo, a prevalência foi de 32,5% (razoável) em Cabo Verde, mas poderia ser melhor, segundo os objetivos da OMS. No entanto, mesmo com esse valor, os resultados em Cabo Verde são superiores ao de dois estudos realizados no Brasil.

Saiba mais: Consumo de leite materno por prematuros está associado ao melhor desempenho cardíaco?

Conforme a campanha de 2022 da Sociedade Brasileira de Pediatria, cabe aos pediatras (e também a profissionais que atuam nos cuidados materno-infantis), promover, proteger e apoiar o AME nos primeiros seis meses de vida do bebê e que ele seja mantido até os dois anos de idade ou mais. Essa é a melhor maneira de se alimentar o lactente.

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Referências bibliográficas: Ícone de seta para baixo
  • Duarte Lopes E, et al. The prevalence of exclusive breastfeeding and its associated factors in Cape Verde. BMC Nutr. 2022;8(1):74. DOI: 10.1186/s40795-022-00554-3
  • Sociedade Brasileira de Pediatria. “Agosto Dourado. Proteja e apoie o aleitamento materno!” 2022. Disponível em: https://www.sbp.com.br/agostodourado2022/. Acesso em: 04/08/2022  

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