Recentemente, o periódico Intensive Care Medicine publicou o artigo Clinical practice guidelines: management of severe bronchiolitis in infants under 12 months old admitted to a pediatric critical care unit que apresenta as últimas diretrizes para o manejo de lactentes menores de 12 meses com bronquiolite grave em Unidades de Terapia Intensiva Pediátrica (UTIP). A publicação foi elaborada por 25 especialistas francofônicos, todos membros do Groupe Francophone de Réanimation et Urgence Pédiatriques (Argélia, Bélgica, Canadá, França, Suíça). Foram divulgadas 40 recomendações, as quais resumimos abaixo:
Critérios de admissão na UTI pediátrica
- Presença de apneias;
- Acidose hipercápnica com pCO2 venoso > 60 mmHg e/ou pH < 7,30 se houver gasometria disponível;
- Estado de alerta alterado e/ou hipotonia;
- Hipoxemia com SpO2 < 92% sob oxigenoterapia padrão (ou seja, cânulas nasais em baixa fluxo até 2 L/min);
- Aumento significativo do trabalho clínico respiratório ou fadiga respiratória.
Para pacientes já internados, é importante considerar a avaliação dinâmica desses parâmetros (opinião de especialistas, concordância forte).
Fatores de risco para admissão na UTI pediátrica
- História de prematuridade, especialmente se < 32 semanas de amenorreia;
- Idade inferior a 6 semanas;
- Identificação do vírus sincicial respiratório (VSR) em oposição a outros vírus;
- Evidência de coinfecção viral ou bacteriana;
- Presença de atelectasia ou consolidação na radiografia (se realizada, ver recomendação R6) ou ultrassonografia pulmonar (consolidação posterior > 1 cm e/ou escore ultrassonográfico pulmonar alto) (GRADE 2+, concordância forte).
- Os especialistas sugerem o uso de escores clínicos para avaliação e acompanhamento do paciente (opinião de especialistas, concordância forte).
- Testes de identificação viral provavelmente não devem ser realizados (GRAU 2-, forte concordância).
- Os especialistas sugerem que o nível sérico de sódio não deve ser verificado sistematicamente. No entanto, o teste deve ser realizado se houver sinais clínicos sugestivos de hiponatremia (opinião de especialistas, concordância forte).
- Os especialistas sugerem que a radiografia de tórax não deve ser realizada rotineiramente, mas deve ser reservada para pacientes com sinais clínicos de complicações ventilatórias ou para a busca de diagnóstico diferencial (opinião do especialistas, concordância forte).
- Os especialistas sugerem que a ultrassonografia pulmonar seja realizada como uma alternativa à radiografia de tórax (opinião de especialistas, forte concordância).
- Os especialistas não podem opinar sobre o lugar dado à gasometria na avaliação inicial, embora seja amplamente realizada na prática. Eles sugerem que a avaliação clínica deve ser o método preferido para julgar a gravidade da condição do paciente (opinião do especialistas, forte concordância).
- Os especialistas sugerem não inserir sistematicamente um acesso venoso periférico (opinião do especialistas, forte concordância).
- Os pacientes provavelmente devem ser colocados em posição supina (exceto para pacientes com suporte de ventilação invasiva). Estudos sobre posição prona são necessários (GRADE 2-, forte concordância).
- Os especialistas sugerem monitorar a tendência dos parâmetros respiratórios e/ou escores clínicos para avaliar a evolução da doença (opinião do especialistas, concordância forte).
- Os especialistas sugerem que pCO2 (e PtcCO2) não devem ser monitorados sistematicamente (opinião de especialistas, forte concordância).
- Os especialistas sugerem que a nutrição enteral gástrica (ou nutrição oral quando possível) deve ser preferida à hidratação intravenosa (IV), independentemente do tipo de suporte ventilatório (opinião de especialistas, forte concordância).
- Não há evidências para apoiar a nutrição enteral contínua sobre a intermitente (sem recomendação, forte concordância).
- Os especialistas sugerem que a nutrição oral ou enteral não deve ser espessada (opinião de especialistas, forte concordância).
- Os especialistas sugerem que as recomendações para ingestão de calórica e proteica no lactente gravemente doente sejam implementadas (opinião de especialistas, forte concordância).
- Quando a alimentação enteral não é possível, os especialistas sugerem o uso de uma solução isotônica em vez de hipotônica. Não há evidências para escolher uma solução isotônica balanceada em vez de uma solução desbalanceada (opinião de especialistas, forte concordância).
- Os especialistas sugerem monitorar o balanço hídrico diariamente para evitar sobrecarga hídrica (opinião de especialistas, concordância forte).
- Os especialistas sugerem o uso de um protocolo de suporte ventilatório não invasivo (opinião de especialistas, concordância forte).
- O suporte ventilatório não invasivo é eficaz para reduzir o trabalho respiratório e melhorar os parâmetros respiratórios clínicos (GRAU 1 +, concordância forte).
- Os especialistas sugerem o suporte ventilatório não invasivo como tratamento de primeira linha, em vez de ventilação invasiva (opinião de especialistas, forte concordância).
- Para a forma mais grave, a pressão positiva contínua nas vias aéreas (CPAP) provavelmente deve ser usada como tratamento de primeira linha, em vez da cânula nasal de alto fluxo (CNAF) (GRADE 2 +, forte concordância).
- O CPAP provavelmente deve ser iniciado em um nível de pressão positiva de 7 cmH2O (GRAU 2 +, forte concordância).
- Os especialistas sugerem o uso de ventilação não invasiva (VNI) com dois níveis de pressão em casos de falhado CPAP e na ausência de critérios de intubação (opinião de especialistas, concordância forte).
- A escolha da interface deve levar em consideração o ventilador utilizado e a expertise da equipe médica. Os especialistas não estão em posição de sugerir um tipo específico de interface para pacientes ventilados com CPAP. Em caso de falha, os especialistas sugerem o uso de máscara facial para melhorar a sincronização paciente-ventilador (opinião de especialistas, concordância forte).
- A CNAF não deve ser usada profilaticamente para reduzir o risco de internação na UTIP (GRAU 1−, forte concordância).
- Uma taxa de fluxo de 1,5–2 L/kg/min provavelmente deve ser iniciada com CNAF e não deve exceder 2 L/kg/min (GRAU 2 +, forte concordância).
- Os especialistas não são capazes de fazer uma recomendação sobre a escolha do modo de ventilação invasiva (sem recomendação, concordância forte).
- O suporte ventilatório não invasivo (CPAP ou CNAF) provavelmente deve ser usado durante o transporte do paciente. Se uma CNAF for usada, um sistema de aquecimento de umidificação deve ser usado. Os especialistas não recomendam intubação de rotina para transporte (GRADE 2 + , concordância forte).
- Os especialistas sugerem que medidas não medicamentosas (presença dos pais, instalação, otimização da interface e ventilação, alimentação) devem ser preferidas para melhorar o conforto do bebê. Se essas medidas falharem, a sedação medicamentosa pode ser usada (opinião de especialistas, forte concordância).
- Corticosteroides, inalatórios ou sistêmicos, provavelmente não devem ser usados (GRAU 2, forte concordância).
- Agonistas beta2 inalatórios e/ou epinefrina inalatória provavelmente não devem ser usados rotineiramente. Em alguns casos, um teste terapêutico pode ser considerado para evitar a intubação (GRAU 2-, forte concordância).
- Os especialistas sugerem que os beta2-agonistas intravenosos não devem ser usados (opinião de especialistas, forte concordância).
- Teofilina intravenosa não deve ser usada (GRAU 1−, forte concordância).
- Os especialistas sugerem que a antibioticoterapia não deve ser usada sistematicamente, mas deve ser reservada para suspeita de superinfecção pulmonar ou coinfecção bacteriana (opinião de especialistas, forte concordância).
- A cafeína provavelmente não deve ser usada rotineiramente em pacientes que apresentam apneia (GRAU 2-, forte concordância).
- O hélio provavelmente não deve ser usado. Apesar dos efeitos benéficos no trabalho respiratório, a viabilidade dificulta a implementação (GRAU 2−, forte concordância).
- A nebulização de solução salina hipertônica provavelmente não deve ser usada rotineiramente (GRAU 2, forte concordância).
- A fisioterapia respiratória provavelmente não deve ser realizada sistematicamente (GRAU 2-, forte concordância).
- Ribavirina, desoxirribonuclease (DNAse), antileucotrienos, sulfato de magnésio e óxido nítrico inalado provavelmente não devem ser usados (GRAU 2-, forte concordância).
Em suma:
§ É necessário identificar os critérios de admissão e os fatores de risco para internação em UTIP; § Exames para identificação viral e radiografia de tórax não devem ser feitos de forma sistematizada. É necessário discutir a indicação de ultrassonografia pulmonar e ecocardiograma, radiografia de tórax, gasometria capilar, ionograma e teste viral; § Não é indicada a colocação sistemática de acesso venoso periférico. Sugere-se a posição supina e o monitoramento clínico, incluindo o uso de escores de gravidade e balanço hídrico. Também não está indicado o monitoramento biológico sistemático: pCO2 (transcutâneo ou capilar) é indicado se houver sinais de fadiga e a natremia deve ser dosada se houver suspeita clínica de hiponatremia; § Com relação à nutrição, deve-se favorecer a alimentação enteral gástrica (contínua ou não). Se for necessária hidratação IV, fazer fluido isotônico (balanceado ou não); § Suporte ventilatório: favorecer suporte não invasivo (incluindo para transporte) e implementar protocolos locais com opção de suporte ventilatório: ü A CNAF não impede a internação na UTIP, devendo ser ajustada a 1,5- 2 L/min/kg e a umidificação é necessária, inclusive, durante o transporte; ü O CPAP é mais eficiente que a CNAF, devendo ter configuração inicial de 7 cmH2O, com o uso de interface nasal ou facial; ü A VNI com dois níveis de pressão deve ser usada em caso de falha do CPAP. Deve ser favorecida a interface facial (sincronização); ü Em caso de não resposta → ventilação invasiva. § Sedação: encorajar a presença dos pais e medidas não medicamentosas; § Beta-2 agonistas: não devem ser usados como primeira linha (pode ser feito teste terapêutico); § Antibióticos: somente se houver coinfecção bacteriana; § Cafeína: provavelmente não deve ser usada; § Fisioterapia: não deve ser feita de forma sistemática; § Não estão indicados: corticoides (por via oral ou inalatória), solução salina hipertônica nebulizada, hélio, sulfato de magnésio, ribavirina, desoxirribonuclease e antileucotrienos. |