O último dia do CBMEDE 2022 (Congresso Brasileiro de Medicina de Emergência Adulto e Pediátrica) trouxe informações importantes com relação a identificação de riscos de infecções na Emergência Pediátrica. Um ponto alto da sessão “Infecção na Emergência Pediátrica: identificando o paciente de risco” foi a palestra “Provas complementares e testes rápidos / Regras de predição para infecção bacteriana grave” com o médico neonatologista e emergencista pediátrico Bruno Moura, do Hospital Albert Einstein, de São Paulo.
O palestrante destacou o uso de biomarcadores para infecções em pediatria, sintetizados abaixo:
- Os biomarcadores são ferramentas de triagem e diagnóstico cuja interpretação depende de uma associação clínica. São úteis para avaliação de resposta do paciente, indicação racional de antibioticoterapia e avaliação de prognóstico e gravidade;
- A proteína C reativa (PCR) é uma proteína inespecífica de fase aguda, de elevada disponibilidade e baixo custo. Apresenta gatilho inflamatório de 4 a 6 horas, tempo de duplicação de 8 horas e tempo de meia-vida de 19h. Possui valor limitado como medida isolada, mas auxilia no manejo terapêutico quando é dosada de forma seriada. Exemplos em que apresenta níveis elevados na prática clínica: pancreatite, queimados e desordens inflamatórias, como artrite idiopática juvenil. Por outro lado, seus níveis são suprimidos na insuficiência hepática e em pacientes imunocomprometidos;
- A procalcitonina é um biomarcador promissor e tem sido o mais estudado na diferenciação de infecções bacterianas na pediatria e em adultos. Seu aumento é precoce (mais precoce que a PCR), seu pico é de 24 a 36 horas, está disponível em alguns exames point-of-care (agilizando o atendimento no pronto-socorro) e auxilia na tomada de decisões com relação à indicação ou não de antibioticoterapia. Entretanto, seu custo é elevado: no SUS raramente é disponível (um kit custa em torno de 590 reais). Portanto, há escassez de dados e protocolos contendo valores de referência na nossa realidade prática. É, sem dúvida, um marcador sensível, mas necessita de mais ensaios randomizados;
- A interleucina-6 (IL-6) é uma citocina pró-inflamatória ainda pouco estudada. É mais elevada na sepse que em outros processos inflamatórios. O especialista mencionou um estudo espanhol que avaliou a PCR, procalcitonina e a IL-6 em pacientes oncológicos febris, sendo a IL-6 mais sensível na diferenciação do paciente oncológico em relação a infecções bacterianas (como neutropenia febril) – é promissora em pacientes oncológicos. Possui boa acurácia quando combinada com outros biomarcadores. Assim como a procalcitonina, também é cara (um kit custa em torno de 360 reais) e não disponível com facilidade na prática clínica;
- A velocidade de hemossedimentação (VHS) é um marcador de doença sistêmica (infecções, neoplasias, doenças autoimunes – sendo difícil a diferenciação entre essas doenças). Seu resultado pode ser afetado por fatores, como temperatura, faixa etária, sexo, gestação e obesidade. O pico é de 24 horas. Uma medida isolada é limitada;
- A avaliação do uso de biomarcadores exige uma análise de custos e organização de protocolos, É importante que sua indicação seja individualizada para pacientes com comorbidades e espera-se que sua disponibilidade seja disseminada para serviços públicos;
- A utilização de biomarcadores não exclui a necessidade de uma avaliação clínica completa.
O médico mencionou que o uso de painel viral em emergência pediátrica tem sido muito valioso, reduzindo as prescrições de antibióticos. Com relação ao strep test, teste rápido com sensibilidade e especificidade muito boas (o padrão-ouro ainda é a cultura), o custo é acessível (25 kits saem a 740 reais – cerca de 30 reais por kit) e estudos mostram que reduz as prescrições de antibióticos (exemplo: paciente com placas, mas com strep test negativo). O palestrante também ressaltou os benefícios dos exames point-of-care (POCT), que apresentam a premissa de resultados mais rápidos, reduzindo o tempo de permanência na emergência, evitando aglomerações e permitindo melhor uso dos serviços do pronto-socorro.
O que há de novo?
O doutor Bruno mostrou os dados de um artigo publicado em 2021 no BMJ: “Procalcitonin and lung ultrasonography point-of-care Testing to decide on antibiotic prescription in patients with lower respiratory tract infection in primary protocol of a pragmatic cluster randomized trial” (Lhopitallier et al.). Esse estudo foi conduzido na Suíça e envolveu pacientes adultos (uma minoria com sintomas de via aérea inferior com necessidade de antibiótico).
Os pacientes foram randomizados em uma proporção de 1:1:1 para antibióticos guiados por procalcitonina sequencial e ultrassonografia pulmonar (UltraPro; n=152), antibióticos guiados por procalcitonina (n=195) ou cuidados habituais (incluindo RX de tórax) (n= 122). Em comparação com os cuidados habituais, a procalcitonina no local de atendimento levou a uma redução absoluta de 26% na probabilidade de prescrição de antibióticos em 28 dias sem afetar a segurança dos pacientes. A ultrassonografia pulmonar no local de atendimento não reduziu ainda mais a prescrição de antibióticos, embora um potencial valor agregado não possa ser excluído, devido a amplos intervalos de confiança.
Veja mais do CBEMED 2022:
- Parada cardiorrespiratória para emergencistas: como ir além do ALCS?
- Reposição volêmica na pediatria
- Sedação e analgesia na emergência pediátrica
- Parada cardiorrespiratória traumática: o que há de novo?
- Controle do sangramento no politrauma em pediatria
- Os dez mandamentos da avaliação de alteração de nível de consciência na emergência pediátrica
- Como manejar a intubação do paciente com disfunção de ventrículo direito
- Congresso apresenta as principais aplicações da inteligência artificial (IA) na emergência
- O que saber quando se deparar com a febre na emergência pediátrica?